A bolsa brasileira registra um déficit de mais de 4 bilhões de reais em capital externo acumulado em janeiro, um movimento amplamente influenciado pela reavaliação das expectativas em relação ao início e à magnitude dos cortes de juros pelo Federal Reserve nos Estados Unidos.
Após o entusiasmo observado no final de 2023, com muitos investidores antecipando uma primeira redução em março, dados sólidos da economia norte-americana no início deste ano e declarações prudentes dos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Fed diminuíram o otimismo.
Na última sexta-feira, a probabilidade de um corte na taxa em março, refletida nos contratos futuros de juros dos EUA, era inferior a 50%. Uma semana antes, essa probabilidade era de quase 80%.
Na B3, essa tendência se manifestou na saída líquida de 4,4 bilhões de reais por investidores estrangeiros até o dia 19 de janeiro. As vendas de ações por esses participantes superaram as compras de forma consistente nos últimos quatro pregões durante o período analisado. Apenas no dia 19, o déficit atingiu 3,45 bilhões de reais.
Esse resultado negativo surge após uma entrada expressiva de cerca de 38,5 bilhões de reais na Bolsa de Valores de São Paulo nos últimos dois meses do ano anterior, considerando apenas as transações no mercado secundário de ações. Ao longo de 2023, o saldo permaneceu positivo, totalizando 44,85 bilhões de reais.
Jerson Zanlorenzi, responsável pela mesa de ações do BTG Pactual, atribui a maior parte desse movimento a uma deterioração no apetite por risco no cenário internacional, especialmente em relação aos mercados emergentes. Isso ocorre em decorrência dos ajustes nas expectativas relacionadas às taxas de juros nos Estados Unidos.
“O mercado moderou a euforia observada no final do ano passado, gerando um movimento de obtenção de lucros”, observou o analista. No caso do Ibovespa, após encerrar 2023 acima dos 134 mil pontos, a queda registrada até o dia 19 deste mês totalizou 4,9%, com o índice atingindo 127.959,94 pontos nesta sessão.
Zanlorenzi destacou que o comportamento do fluxo de estrangeiros é mais uma questão global do que algo específico do Brasil. Ele reconheceu um aumento recente no noticiário de Brasília, especialmente em relação a questões fiscais, mas afirmou que esses temas já estavam no radar.
Para ele, o movimento atual representa um ajuste pontual da euforia do ano passado, e a tendência de apetite ao risco e queda de juros nos EUA deve persistir no médio e longo prazos.
O recuo de pouco mais de 5% do índice MSCI de mercados emergentes até a última sexta-feira sustenta a ideia de uma questão global envolvendo os mercados emergentes, uma vez que o rendimento do Treasury de 10 anos subiu de 3,86% para 4,146% no período.
A reunião do Fomc na próxima semana é aguardada com expectativa, e embora o consenso indique a manutenção da taxa básica de juros, o comunicado que acompanhará a decisão no dia 31 fornecerá pistas sobre os próximos movimentos de política monetária nos EUA.
Antes disso, as atenções continuarão voltadas para os dados econômicos dos EUA, com destaque para o índice de preços de gastos com consumo (PCE) de dezembro, uma medida de inflação amplamente monitorada pelo Fed.
Uma pesquisa da Reuters divulgada nesta terça-feira indicou que a maioria dos 123 economistas consultados espera que o Fed aguarde até o segundo trimestre antes de cortar as taxas de juros, sendo junho considerado mais provável do que maio. Essa maioria também prevê uma flexibilização menor neste ano em comparação com as precificações dos mercados financeiros.
Economistas do JPMorgan, em um relatório recente, anteciparam que o Fomc enfatizará a paciência e o progresso em sua reunião no final do mês. Eles também observaram que outros bancos centrais de economias desenvolvidas estão igualmente relutantes em recuar em suas políticas restritivas até que haja mais evidências de desinflação.
Na semana passada, o presidente-executivo da B3, Gilson Finkelsztain, afirmou em entrevista que percebe muitos investidores estrangeiros interessados no Brasil, envolvidos em conversas com as empresas. No entanto, ele ponderou que há um receio por parte deles em investir de forma mais robusta, e acredita que esse movimento ocorrerá apenas quando houver maior clareza sobre a política monetária dos Estados Unidos.